terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Garçom, um chopinho, por favor!



Em fins do século passado, oito policiais de Hong Kong carregavam um vietnamita repatriado para embarcá-lo no avião que o conduziria de volta ao seu país de origem. A foto estampada nos jornais do mundo inteiro lembra outros fatos não tão remotos, tais como refugiados asiáticos abarrotando navios, à deriva em alto mar, sem porto de destino; a invasão de albaneses impedidos de aportarem na Itália. Nos dias atuais, não existem muralhas capazes de conter essa horda de desesperados. Os recursos e as necessidades interagem-se, buscando equilíbrio na sua adequada distribuição.
Tempos atrás, fascinava-nos - e ainda nos ilude - o american way of life da grande potência do Norte, o paraíso sonhado por todos que almejam alguma perspectiva em sua vida. A velha história do saco de gatos. A acumulação de riquezas ameaçada pela imprevidência de se pensar na desagregação social e econômica no meio externo. Constatamos assim uma tendência dos países de se constituirem em blocos regionais, visando a própria segurança e preservação da qualidade de vida dos seus habitantes.
O Velho Mundo já vem consolidando a sua integração econômica: nem mesmo a democratização dos países do leste europeu - uma quebra na órdem estabelecida - demoveu-o da tarefa abrangente. Os Estados Unidos também expandiram suas barreiras alfandegárias até Canadá e México. E mesmo nações insulares procuraram aproximar-se como Austrália/Nova Zelândia e Japão/Tigres Asiáticos. Esses mercados comuns resultaram de um processo histórico, econômico, social - gradual - atendendo à compatibilização de requisitos macro-econômicos nas áreas cambial, fiscal, creditícia, agro-industrial e outras.

O Mercado Comum do Sul, como todos seus similares, apresenta uma contradição em sua prática, sendo liberal entre os países membros e protecionista em relação a outras nações. Porém, o objetivo de longo prazo é a integração de toda América Latina, preconizada pela ALADI. O ideal seria a síntese de Gondwana. E, a continuar nesse indefinido exercício de futurologia, ainda assim se manteria a discriminação, dependendo de um certo grau de relatividade. Na gênese do processo europeu, França e Alemanha, adversários na II Guerra Mundial, firmaram o célebre acordo do carvão e do aço em consolidação à paz sonhada dos seus povos.
A poluição das cinzas da termo-elétrica de Candiota sobre a cidade de Mello, no Uruguai; as consequências da barragem de Itaipu nas hidrovias argentinas; o ensino da língua portuguesa nas escolas uruguaias para conter o portunhol, são exemplos que ocorrem para demonstrar a importância da cooperação econômica, social e cultural dos protocolos internacionais e dos projetos conjuntos como condição favorável para a elevação da produtividade, o desenvolvimento cientítico-tecnológico e a expansão dos mercados.

sábado, 26 de janeiro de 2008

A indiferença dos privilegiados

Fim de tarde, estou só em casa. A cachorra late, fico sabendo que alguém chegou ao portão de entrada. Pelo olho mágico, vejo o rapaz parrudo, barba por fazer, roupas desbotadas, aparenta vinte e poucos anos. Poderia ser meu filho. Não é a primeira vez que bate em minha porta; nestas ocasiões sempre me pede um pão que eu nunca lhe nego. É a própria mansidão, cobrando de mim a indiferença dos privilegiados. Peço-lhe que me aguarde enquanto preparo um sanduíche de queijo e mortadela.
Quando vou lhe passar o alimento, vejo mais dois indivíduos invadindo o jardim para interrogá-lo. Reparo nas suas coloridas roupas esportivas: um deles, branco, estatura média, bom cabelo, óculos escuros; o outro, mulato sarará, de cavanhaque, magro, um pouco mais alto. A prepotência deles me irrita; digo-lhes para não importunarem o moço, afinal está na minha propriedade e deve ser respeitado como ser humano.
Então se identificam: são policiais e dizem estar observando aquele homem que vinha batendo de porta em porta a ver se havia gente nas casas, um potencial arrombador; querem apenar ajudar, perguntam-me se o conheço. Respondo que sempre o tratei como todos seus iguais, que nunca saíram de mãos vazias da minha solidariedade.
O sangue me ferve na cabeça; aproveito para reclamar da corrupção, dos salários baixos, do desemprego, enfim da causa real de toda essa violência e criminalidade dos dias atuais. Eles concordam, viram as costas e vão-se embora. Entrego o pão para o rapaz, ele me agradece.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Comentário de Agilmar Machado sobre a música Verão em Laguna

Pois eu vivo, no cotidiano, toda a poesia do mar de Laguna.
De onde estou neste momento vislumbro a balsa passando o canal da barra e o Farol de Santa Marta como um dedo branco apontando para o céu; os molhes da barra e, do outro lado, o vilarejo de Ponta da Barra.
À minha frente, o imenso mar azul e, num detalhe entre prédios (à esquerda), exclusivamente reservado para mim, a Ilha das Araras...
Laguna é uma realidade para sonhar...
Abraços, Manitos que ainda têm poesia no sangue e na alma...
Transcrevo acima o comentário de Agilmar Machado, uma pequena crônica, a prosa poética desse conceituado radialista de Santa Catarina, sobre a música Verão em Laguna, esta belezura de letra e melodia de autoria do amigo Guilherme Braga, com a sua própria interpretação, que foi postada em minha matéria A Música Que Vem do Sul-2, no sítio Caros Ouvintes, o qual pode ser acessado através da barra à direita.

domingo, 6 de janeiro de 2008

O que a gauchada não andou aprontando lá por Três Corações...

Se tivesse servido à Pátria, teria pertencido à classe de 37, como fizeram alguns contemporâneos, amigos e colegas de Ginásio, que sentaram praça no Regimento Osório (Cavalaria), então sediado em Jaguarão-RS. De lá partiram para Três Corações-MG, a fim de cursarem a Escola de Sargento de Armas, companheiros de mocidade como Eulálio Delmar Faria, Idomar dos Santos (recentemente falecido), Mário Teixeira de Mello Affonso e Francisco Alberto de Lemos Mestre, apelidado Castelhano por ser oriundo de Montevidéu/Uruguai, onde fora criado desde tenra idade.
O Eulálio é um desses matreiros que se vale da falsa modéstia para tirar vantagem a posteriori e, assim que chegou à ESA foi logo cercado pelos mineiros vindo com uma conversinha mole:
- Gaúchu, vaincê devi muntá muintu beim, num qué dá u'a dimunstraçãzinha prá nóis?
- Que é isso, gente, eu nunca montei a cavalo, só fazia serviço burocrático lá no Regimento – foi o que respondeu o nosso amigo.
Quando começaram as instruções, o Eulálio foi montando e deixando os mineiros impressionados – uai, i vaincê dizia qui num sabia muntá, imagim si subessi – e logo conquistou a admiração do pessoal da Cavalaria, tanto assim que foi escolhido para conduzir o estandarte da ESA empunhado com o braço esticado na horizontal, escoltando a bandeira nacional na parada militar do Dia da Pátria, naquela cidade..

sábado, 5 de janeiro de 2008

...ou de como o alegretense Carvalho reabilitou o cavalo Jaburu

Pois agora o Eulálio me conta o causo daquele tenente-farmecêutico que costumava participar das competições hípicas daquela cidade, montando o cavalo Jaburu, o qual sempre empacava no 3º obstáculo e fazia com que o cavaleiro voasse sobre o pescoço do animal.
Havia na Escola uma prova que consistia em colocar todos os alunos da Cavalaria correndo atrás da tropa de matungos solta campo a fora para agarrar cada um a sua respectiva montaria e depois conduzí-la até o local onde pegariam o buçal, o freio, a manta, a sela, a cilha e a sobrecilha. Assim, os dez primeiros a se aprontarem classificavam-se para competir na equipe de hipismo da Escola, com direito a escolher a cavalgadura segundo a órdem de chegada, que se encerrava quando o último alcançava a 10ª sobrecilha - eram só dez e, desta forma, os demais sobravam para assistir a corrida de obstáculos.
Diz o Eulálio que se atrasou para alcançar a décima sobrecilha, pois um índio guapo de Alegrete, o Carvalho, já tinha tomado conta da mesma.Para escolha desses felizardos havia apenas 10 cavalos de competição, um dos quais era o Jaburu - e adivinhem qual é o que sobrou para o alegretense Carvalho?
O Carvalho, na dúvida, ainda propôs ao Eulálio para que ficasse com a sua sobrecilha e este prontamente declinou da honraria. Não restou àquele outra alternativa se não montar no Jaburu, já antevendo o fantástico vôo por sobre o pescoço do animal.
Apesar de castigado, este alegretense para bobo não servia e a primeira idéia que lhe ocorreu foi a de soltar um pouco as rédeas, dando maior liberdade de movimentos para o Jaburú.Aí aconteceu a façanha do Jaburu fazer pista limpa, superando todos obstáculos e chegando em 2º lugar, apenas perdendo a primeira posição no tempo da prova.
A galera delirou e o Carvalho virou herói, tendo em vista que um aluno tinha conduzido o Jaburu de uma forma que o tenente-farmacêutico nunca tinha conseguido levar. Carregado nos braços da torcida, o Carvalho recebeu a consagração do mergulho no bebedouro dos cavalos.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Páginas da vida que contam uma história, e mais uma história...

Advogado, escritor, historiador e pesquisador das nossas origens, Eduardo Alvares de Souza Soares, desde 22 de julho de 1995, mantém a coluna Páginas da Vida no jornal A Folha, de Jaguarão-RS, onde vem registrando atos e fatos do cotidiano, principalmente jaguarense, vividos ou por ouvir contar, acrescidos ou a partir de pesquisa, quando necessária.
Essa coluna, por sinal agradabilíssima, recheada de informações bastante objetivas e curiosas, já tem rendido a seu autor algumas publicações de fôlego, tais como Santa Casa de Caridade de Jaguarão (2003), Um Século de Beneficiência (2004) e Ponte Mauá - Uma História (2005), além de estar preparando obra sobre a Igreja Matriz do Divino Espírito Santo da Cidade de Jaguarão.
Agora, por ocasião da passagem do 70º aniversário daquele semanário jaguarense, Souza Soares vem de lançar mais uma coletânea de seus artigos, intitulada n'A Folha, cuja concorrida sessão de autógrafos aconteceu a 26/12/2007, na Casa de Cultura de Jaguarão.
Esta publicação, mais uma vez vem ao encontro e atende aos anseios da sociedade jaguarense de ver resgatadas muitas histórias da tradição oral e escrita de seus antepassados que, de outra forma, estariam condenadas ao esquecimento, mormente daqueles que hoje constituem as inúmeras colônias jaguarenses espalhadas por este mundo velho sem porteiras, deixando a terra natal em busca de melhores oportunidades em outros rincões.
Basta que se diga que o livro comemorativo ao 140º aniversário, em 2002, do lançamento da pedra fundamental da Santa Casa de Caridade de Jaguarão, a quinta mais antiga do Estado, foi o resultado de uma série de 165 publicações em A Fôlha.
Em suma, garanto que aquele que se der à pertinácia de recorrer as 414 páginas dessa obra, deverá sentir-se com o ego massageado e o orgulho reabilitado pela cultura da nossa terra.